No coração do Príncipe Real, onde restaurantes com diversos conceitos não faltam, o Pão à Mesa aposta numa nova carta com sabores portugueses re-inventados.
Temos a moda das hamburguerias, das cevicherias, das tapas. E, depois, uma que parece ser a base de 99% das cartas Primavera/Verão, que andam a ser apresentadas por estes dias. É a cozinha portuguesa re-inventada.
Isto será porque a nossa gastronomia já está esgotada? Já não se pode comer uma açorda de marisco apenas com marisco e pão, sem pimentos padrón ou gengibre?
Só numa semana visitámos dois espaços que dão um twist à nossa cozinha, um com resultados mais bem conseguidos que o outro. Onde se sente o tal twist, mas de uma forma que nos surpreende mais é no Masstige. Os petiscos, como o Escabeche de Perdiz, são exemplo disso mesmo.
O outro, onde é evidente um esforço em apresentar sempre qualquer coisa nova, às vezes de forma bastente insistente, é no Pão à Mesa, um restaurante que fica no Príncipe Real.
Aqui, onde a decoração bate aos pontos a carta, há alusões a Pessoa, a Amália, enfim, à portugalidade. E um pormenor que adorámos: há tremoços, morcela, queijo de ovelha e farinheira no couvert. Devia ser isto o “pão nosso de cada dia”.
O Pão à Mesa decidiu, apesar da renovação, manter alguns pratos que, segundo os responsáveis, foram um êxito em 2016. Mantêm-se, assim, na carta, quatro pratos todos com Pão Saloio (um exagero, tendo em conta que o restaurante serve vários tipos de pão no couvert) e dois de camarão.
No entanto, as novidades acabam por equilibrar as coisas: na nova carta de Primavera/Verão, criada pelo chef António Amorim, há canivetes grelhados com favas, salada biológica ou cappuccino de camarão.
Mas é depois, nos pratos principais, que a coisa se complica: a tranche de pregado vem com arroz de lingueirão, este último só por si uma refeição completa; as plumas de porco preto vêm num prato que dava para fazer quatro diferentes (foto em baixo).
Com camarão, legumes assados, um puré de abóbora doce como tudo, até uma sobremesa era possível fazer com esta sugestão que o chef nos serviu. O prato acaba por ser uma enorme confusão de sabores e cada garfada parece vir de um prato diferente. É como se fosse um menu de desgustação concentrado.
Por outro lado, os filetes de polvo com açorda, chips e molho de tártaro, muito bem fritos e sem exacesso de óleo, foram das coisas que mais gostámos neste novo menu do Pão à Mesa.
Mas, acabou mesmo por ser nas sobremesas que nos vingámos dos erros de casting de alguns pratos do almoço. Aqui, não há enganos: é tudo muito bom e excelentemente bem apresentado.
Veja-se, por exemplo, o caso do leite creme com farófias de limão, onde um frasco entornado convida a dar colheradas generosas, ou o fantástico pudim abade priscos com caramelo e vinho do Porto.
A carta do Pão à Mesa precisa de alguns ajustes: há pratos que funcionam muito bem, mas há outros que são mais show-off que demonstração de culinária portuguesa re-inventada. Esperamos voltar em breve, quando estas arestas estiverem limadas.