Moonlight é o mais recente título realizado por Barry Jenkins. Um drama que retrata a vida do jovem Chiron, ao longo de três momentos da sua vida, e a viagem pessoal que faz até conseguir descobrir quem é.
Há já alguns meses que Moonlight anda a gerar ‘buzz’ nos Estados Unidos. Por cá, chega esta Quinta-feira, dia 2 de Fevereiro, às salas de cinema, já depois do anúncio das nomeações aos Óscares da Academia.
Tudo bem que as nomeações valem aquilo que valem, mas não é de todo caso para não levar a sério as oito nomeações conquistadas por este Moonlight (Melhor Filme, Melhor Actor e Actriz Secundários, Melhor Realizador, Melhor Cinematografia, Melhor Banda Sonora, Melhor Edição de Vídeo e Melhor Argumento Adaptado).
Foquemo-nos no enredo: a história de Moonlight é extremamente bem contada, o que, aliado a interpretações fortes, dá um toque verdadeiramente belo à narrativa. Barry Jenkins adaptou ao cinema o guião da peça In Moonlight Black Boys Look Blue, escrita por MacArthur Fellow Tarelly Alvin McCraney.
Chiron é o elemento principal de Moonlight, que se desenrola em Miami, mais precisamente no bairro de Liberty City, conhecido como um dos mais problemáticos de Miami. Com uma inteligente divisão em três actos, ficamos a conhecer três versões de Chiron e, consequentemente, três actores diferentes que lhe dão vida.
Na infância, Chiron é conhecido como Little, uma criança vítima de bullying, tímida e fechada, fortemente afectada pelos problemas da sua mãe. Naomie Harris dá vida a Paula, uma viciada em crack, algo que marca a vida de Chiron.
Moonlight recorre à subtileza para contextualizar os problemas de Little com a mãe, com algumas cenas absolutamente marcantes a nível visual. Jenkins, que também cresceu no bairro de Liberty City, também teve uma mãe viciada em drogas, e terá utilizado esta experiência pessoal para o argumento do filme.
Moonlight não é só um filme sobre raça, sexualidade ou privilégio. É um filme sobre a identidade, sobre a diferença entre quem somos, quem queremos ser ou aquilo que querem que sejamos. Num filme tão rico em pormenores, apesar de bem contada, a história não é o único ponto forte de Moonlight.
As composições de imagem, o recurso a diferentes velocidades na acção e na imagem que vemos no ecrã – a infância é retratada com planos de imagem turbulentos, com rapidez, enquanto a última fase, a idade adulta e Black, é mais estática e contida – ficam na memória do espectador. A riqueza de pormenores é indiscutível neste Moonlight: pelo cuidado de planos que são comuns às três divisões, que merecem mesmo um olhar atento.
A banda sonora, também ela nomeada para um Óscar, é de uma riqueza extrema e funciona como um complemento à história do filme – e não apenas um acessório, algo que tem de estar lá. Por exemplo, o recurso ao tema Every Nigger is a Star, de Boris Gardiner, é a primeira coisa que ouvimos neste Moonlight.
Em 2015, foi utilizada por Kendrick Lamar, como um sample no tema Wesley’s Theory – curiosamente, também a primeira coisa que ouvimos do disco To Pimp a Butterfly. Lançada em 1974, a música tinha como intuito mudar a percepção da palavra ‘nigger’ na Jamaica, além de encorajar os negros a terem orgulho na sua História e em quem são.
Daí que o recurso a esta música faça tanto sentido no ponto inicial de Moonlight: «em algum momento da vida vais ter de escolher quem vais ser», como é dito por uma das personagens do filme.
Este é apenas um dos exemplos, mas há muito mais nesta banda sonora a cargo de Nicholas Britell, seja uma composição clássica com um toque mais moderno ou um clássico de Barbara Lewis.
O tema principal de Moonlight não é propriamente novo, o percurso de descoberta humana tem sido uma constante no cinema, mas a película está uns furos acima do habitual, muito pela execução visual e pela forma calma, porém não menos poderosa, como Barry Jenkins nos conduz ao longo da vida de Chiron.