Crítica: Not to Disappear – Daughter

Passaram três anos desde o lançamento do primeiro longa duração, If You Leave, do trio Daughter. A essência que já compunha o registo anterior mantém-se neste Not to Disappear, com uma sonoridade mais madura.

Ouvir um álbum de Daughter inclui sempre uma boa dose de melancolia e, quiçá, até alguma angústia. A voz de Elena Tonra traz à tona um quê de desilusão, ansiedade e preocupações existenciais. Se isso já estava bem patente em temas do registo de estreia, como Youth ou Smother, em Not to Disappear, pode-se bem dizer que o sentimento de nostalgia está uns furos acima.

Composto por dez faixas, é um álbum que cumpre com as expectativas e promessas feitas no LP de estreia. Continua a ser vulnerável e de digestão pouco fácil, com temáticas pouco leves, mas não é uma mudança de direcção para a banda ou uma deslumbrante surpresa.

New Ways é o tema que abre caminho para este álbum. «I live alone, alone, alone» ou «I need new ways to waste my time» são versos recorrentes, interrompidos por uma guitarra eléctrica e um som em tudo semelhante a gaivotas, que causa estranheza naquele contexto.

Daughter também relata muitas vezes uma ideia de romance que em nada tem a ver com príncipes e princesas. Em Numbers, apresentado como um dos singles da banda, Elena repete até à exaustão «He better, he better, he better make me better», relatando uma relação que precisa desesperadamente de alguém que precisa de pôr fim a um estado de letargia – «I feel numb in this kingdom».

Mas esta não é a única vez em que há um retrato de desilusão amorosa. Alone/With You é uma pequena ode à dicotomia entre as coisas que, à medida que o tempo passa, vamos descobrindo que odiamos no outro. «I hate dreaming of being with you» é acompanhado por um coro de uuhs, enquanto uma batida de fundo acompanha o debitar de razões para o fim de uma relação, num tema marcado também por alguma auto-repulsa.

Doing the Right Thing é angustiante, com o seu quê de belo. Há uma preocupação com o futuro, uma ansiedade com o que pode acontecer, envolta numa sensação de quem perdeu tudo («I have lost my children, I have lost my love, I just sit in silence»). Teve direito a videoclip, em que a sensação de perda está aliada à demência.

 

Rápida, a música mais curta do álbum, No Care, desaparece como um fósforo. Além de ser a música que, à primeira audição, parece mais feliz e animada, é também a única mais dançável deste Not to Disappear. Em passo de corrida, a auto-estima não está tão elevada quanto os Pirinéus, como é visível em «no one asks me to dance because I only know how to fail», onde a vocalista canta uma história de… surpresa, alguma desilusão. E, tão depressa quanto surgiu, assim termina este tema, de forma abrupta.

Not to Disappear é, de uma forma geral, um álbum que continua a pôr a nu todas as fragilidades e mais algumas. A única diferença entre o segundo registo da banda e If You Leave é que, com três anos de distância, tudo se torna muito mais claro. A necessidade de tornar tudo etéreo e poético acabou, as dores e desilusões são mais palpáveis e cruas, sem grandes necessidades para eufemismos. A acompanhar, também as guitarras se tornaram mais ácidas e as batidas menos angelicais. Em linhas gerais, para uma audição rápida, Numbers e no Care constroem bem a imagem geral de um álbum aceitável, mas não extraordinário.

Sonha ter um walk in closet desde pequenina, mas enquanto isso não acontece, contenta-se a coleccionar maquilhagem e anéis. Não consegue resistir a uma boa sobremesa e a um belo livro. Passa a vida a ouvir música e tem uma lista de todos os concertos que já viu.